A discrepância do salário pago aos professores em todo o país mostra a complexidade e a urgência de enfrentar a questão da remuneração docente, apontada há décadas como um dos pilares para a melhoria da qualidade da educação no país.
O
futuro Plano Nacional de Educação (PNE), que há mais de um ano tramita no
Congresso Nacional, é claro: um dos principais objetivos educacionais para a
próxima década é a valorização do magistério. O tema, obviamente, não é
novo. Foi mote da campanha da presidente Dilma Rousseff, em 2010; base de
mobilização do Todos pela Educação, em 2011, e há pelo menos duas
décadas, sempre citado entre as receitas para a melhoria da qualidade da
educação no Brasil. Mas, para sonhar com a meta futura, pode-se afirmar que a
demanda recente resultou em uma carreira docente efetivamente mais valorizada?
E como medir se isso ocorreu na prática? Entre as possíveis variáveis a serem
analisadas, ao menos um indicador pode dar pistas para quantificar esse
fenômeno: a remuneração docente.
Desde
2008, com a Lei do Piso, os professores ganharam, ao menos, a proteção de uma
regulamentação nacional. Mas levantamento realizado pela revista Educação
mostra que cinco estados ainda pagavam salários abaixo do piso nacional em
2012, reajustado no começo do ano para R$ 1.567. Além disso, outro ponto da lei
é praticamente esquecido quando se trata de seu cumprimento: a obrigatoriedade
da destinação de um terço da jornada para atividades extraclasse. Nesse
quesito, 15 estados não cumprem a lei, cinco anos após a sua implantação.
Em
contrapartida, outro levantamento exclusivo mostra que, na última década, a
carreira docente teve avanços importantes do ponto de vista salarial. Se a
remuneração ainda não atingiu o nível esperado pelos profissionais, ela saiu de
níveis 'miseráveis' em alguns lugares do Brasil no início da década passada e
apresentou uma recuperação melhor do que outras categorias. Para se ter uma
ideia, um professor com nível superior da rede pública não federal ganha, hoje,
114% a mais do que ganhava há oito anos, em valores nominais. Entre 2003 e
2009, o crescimento médio dos salários dos professores com 12 anos de
escolaridade ou mais foi de 14%, considerando o ganho real após a correção
monetária, enquanto o salário de outros profissionais com a mesma escolaridade
diminuiu 1,63%. Mas, se as conquistas foram tão importantes, por que é comum os
professores não se sentirem valorizados?
'Formação,
remuneração, melhoria das condições de trabalho e carreira são os quatro
pilares que poderiam mudar essa situação. O problema é que o MEC [Ministério da
Educação] ainda não botou energia nisso', diz o membro do conselho de
governança do Todos pela Educação, Mozart Neves Ramos. O quadro, entretanto,
tem perspectivas de mudanças. Segundo Mozart, um plano de valorização docente
está sendo estudado pelo Ministério da Educação.
'Hoje
há uma valorização, mas muito longe de atingir o nível necessário. Como o
professor recebia muito pouco, ainda que ele tenha sido valorizado, temos uma
defasagem muito grande', defende Roberto Leão, presidente da Confederação
Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).
Perdas e ganhos
É
verdade que nos últimos anos, principalmente a partir da década de 90, houve
significativos avanços na condição salarial do magistério no Brasil. Mudanças
nos mecanismos de financiamento dos sistemas de ensino - como a criação do
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do
Magistério (Fundef), em 1997 - e mesmo a recente Lei do Piso, garantiram ganhos
econômicos importantes para a categoria. Mas tantos anos de perdas econômicas e
baixos vencimentos cobram seu preço. Mesmo com ganhos reais acima da média
nacional nos últimos anos, o professor brasileiro ainda recebe menos em
comparação a outras profissões de nível superior. Levantamento elaborado pelo
Instituto Metas - Avaliação e Proposição de Políticas Sociais, a pedido da
revista Educação, aponta que em 2011 o salário médio dos professores da
Educação Básica com nível superior da rede pública não federal era de R$ 2.420.
No mesmo ano, outros profissionais de nível superior recebiam, em média, R$
3.652. A discrepância, entretanto, já foi maior: em 2003, a remuneração de um
profissional de nível superior era 86% maior do que a de um docente da rede
pública.
A aparente boa notícia, porém, é a de que a variação da remuneração paga nos
estados também foi grande: um professor do Piauí, por exemplo, ganhava em média
R$ 560 por uma jornada de 40 horas semanais em 2003 - menos do que o salário
mínimo atual. Em 2011, a média salarial no estado passou para R$ 1.500, o que
representa um crescimento de 167%. Goiás, Sergipe e Mato Grosso do Sul foram os
estados onde a remuneração média do professor mais cresceu no período, com
variações superiores a 200%.
Mas,
para o professor Rubens de Camargo, da Faculdade de Educação da Universidade de
São Paulo (Feusp), os ganhos salariais que podem parecer expressivos à primeira
vista devem ser analisados com parcimônia. 'A variação salarial foi maior no
Norte e Nordeste também porque a remuneração nesses estados era irrisória. Com
a implementação dos fundos [Fundef e Fundeb] e com o estabelecimento mais
recente do piso, se começa a ter uma diferença, no geral, bem significativa,
mas ela se deve mais ao fato de que os salários dos professores eram muito
baixos', destaca.
Fonte: Revista Educação.
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